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sábado, 26 de junho de 2021

Triste

 Escrevo aqui, primeiro, porque ninguém mais lê blogs, então, o que aqui estiver, pouco ou nunca será lido. Blog tornou-se "cringe". Segundamente, se é que essa palavra existe, escrevo porque hoje estou triste e este é o único sentimento que eu realmente não gosto de compartilhar.

Constatei, hoje ainda, que estou cada vez mais calvo. Isto nunca me incomodou verdadeiramente, mas confesso que me assusta em alguma medida observar o quanto meus cabelos estão simplesmente parando de crescer na parte frontal de minha cabeça. Muito rapidamente. Talvez aos 35 eu não terei mais cabelo algum na metade da frente da cabeça. Confesso que essa velocidade me assusta, mais do que o ritmo de derretimento das geleiras e o aquecimento global. Eu espero que até os 35 eu encontre alguém que realmente não se importe de amar um cara calvo.

Por falar nisso, eu acho que sou orgulhoso em alguma medida. Sexo é bom, mas isso não significa que eu deva instalar o Tinder para transar com as pessoas. Por outro lado, eu me considero realmente um cara legal. Talvez isto seja um referencial errado. Mas eu me acho legal (ou acredito demais em quem diz isso sobre mim). E por me achar um cara verdadeiramente legal, eu sou orgulhoso o suficiente para não correr atrás de quem eu acho que possa ter me esnobado. E isso é muito louco, porque eu sou um cara cada vez mais calvo e que, de vez em quando, também precisa transar.

Talvez, mais forte em mim do que o desejo sexual seja o senso de orgulho pessoal, de não me sujeitar a qualquer farelo de afeto por alguns momentos de divertimento. Mas reiterando, eu sou um cara calvo. O que eu penso que sou? O calvo príncipe William? Afinal, o que eu quero nessa vida?

Hoje, descobri que uma pessoa se prostitui. Isso me deixou bem triste. Talvez seja o motivo da minha tristeza de hoje. Eu realmente não consigo julgar. Aliás, nem cabe a mim qualquer tipo de julgamento nesse sentido. Mas eu me sinto triste em pensar que alguém se prostitui por necessidade. É um sentimento de que todos falhamos e não fomos capazes de evitar algo assim. Eu sinto nojo e meu estômago chega revira só de pensar em alguém tendo que se prostituir. Eu tinha vontade de dar tudo que tenho na minha conta pra essa pessoa. Talvez, se eu fosse só na vida, eu faria isso. Prevejo que serei um velho muito solidário, se sozinho eu for.

Nessas horas, eu penso que eu realmente tenho um coração bom. Eu me revolto com coisas que eu deveria me revoltar, me entristeço com coisas que eu deveria me entristecer, mas eu estou preocupantemente calvo. E isso, não é suficiente para resolver meus problemas. Eu realmente nutri algum afeto por todas as pessoas que me disseram que eu seria um cara legal, mas que elas não estavam em um bom momento na vida para se envolver com ninguém. Eu não julgo mais a verdade dessa justificativa, porque não cabe a mim julgar onde mora a verdade no que as pessoas dizem para a gente com ar de verdade. Me resta querer acreditar em todas as pessoas. Eu sempre acredito no que me dizem. E, por isso, eu só fiquei com a parte que me interessa dessas justificativas, qual seja, aquela que diz que eu sou um cara legal. E assim, vocês criaram um monstro, porque nunca me disseram que o problema seria eu ser calvo, magro, pau grande, morar com a mãe, ter paladar infantil, ser muito doce e outros defeitos do tipo. Vocês me enganaram, pois falaram apenas que eu era um cara legal. Deixaram a mim a tarefa de descobrir todo o resto. Triste.

E assim, vamos. Tentando ser menos calvo, menos magro, menos pau grande, menos apegado com a mãe, menos paladar infantil e tentando exercitar um temperamento mais rude e grosseiro. No fim, tudo parece um grande jogo, cujo único sentido seja trabalhar e deixar-se ficar calvo quando a vida quiser deixar. Se tiver como evitar que alguém se prostitua na vida, o faça. Ninguém merece vender o corpo para sobreviver. A mim, resta crescer. Jogar, viver, deixar viver e, porque não, deixar morrer. 

Me desculpem, seus cringes. Hoje eu tô triste. Não tenho outro motivo para escrever. 

segunda-feira, 7 de setembro de 2020

July

Por 10,
Muda-se:
A versão
E a gestão.

Depende dos zeros.
Alguns combinam,
Muitos dividem,
Poucos eliminam. 

Nas noites tristes,
Reais não resolvem,
Fantasias consolam,
Centavos rememoram.

Perde-se a rima,
A mina,
Tristeza que desatina,
Sem obra-prima.

Em outros tempos,
Julho era festa,
De uma beleza pueril.
Inocente fantasia.

Hoje, julho foi descrença,
Carrossel de desgraças.
Ensinou com sadismo,
Não houve arcadismo.

Aproxima-se o desfecho,
Mais um fim.
Sem começo,
Um final ruim.

Lamento urbano

Ela não aprecia o que eu escrevo;
É de uma indiferença comovente.
Talvez, algum juízo de valor;
Quem sabe uma reprovação.

Eu me decifro nas palavras
E me complico nelas também.
Com as mesmas que escrevo
Eu ouço o que não digo.

Há uma profunda contradição
Em escrever o que não diz
E em dizer o que não escreve.
Afinal, para que escreves?

Escrevo pela companhia,
Pelo soco na solidão,
Pela consciência perdida
E em busca de perdão
Ou paixão.

De onde escrevo já não há luz,
Além da terça-feira que invade
Com cobranças
De um dia da semana infeliz.

Tenho pena das terças;
Nunca serão como as sextas.
Tenho pena dos meus sentimentos;
Nunca serão mais que momentos.

Não rimo mais,
Só lamento.
Não acredito mais,
Só invento.

Há coragem na resignação,
Aprendizado na frustração.
Sem afeto na paixão,
Só lamento no coração.

quinta-feira, 3 de janeiro de 2019

Sara

Malandro não para, só dá um tempo...

O mundo anda muito chato ultimamente. Aliás, as pessoas andam muito chatas. Histéricas demais, mais precisamente. Um absoluto descontrole. Gritos, rosnados, mordidas, tiros e tudo mais que seja ariano e impulsivo. Um saco.

As pessoas andam muito extremas, armadas com pistolas ou balanças de julgamento nas cinturas. Primeiro atiram e depois julgam.

Perdi um pouco do encanto de escrever, de debater, de ensinar e (porque não) de aprender. Tudo anda muito à flor da pele. 

Voltamos aos tempos em que as pessoas acreditam em ameaça socialista, em necessidade de combater a expansão dos costumes e ideologias que ameaçam a família. Eu realmente ando sem paciência para conversar com essa gente sobre sociedade/política. Não consigo. Simplesmente não consigo.

Comprei uma piscina de plástico e coloquei na varanda do meu apartamento. Não quero saber de mais nada. Só me interessa assistir mesas redondas de futebol e conversar sobre amenidades.

Por menos praia e mais educação. Menos sol e mais inverno. Os tempos de frio ensinam e os dias de calor desatinam. Talvez seja isto: o aquecimento global queimou nossos miolos e elegemos um cara teimoso e retrógrado. Odeio gente teimosa. Na teimosia falta humildade, sobra orgulho e extremismo e escolhas impulsivas. Mas o que é a vida senão uma sucessão de escolhas burras? O problema é quando nós é que precisamos suportar as consequências das escolhas burras do outros e, pior, ter que corrigi-las.

Um freak show.

Estou me tornando, além de velho, um cara chato e azedo. Mas um cara azedo doce, tipo agridoce (aliás, odeio molho agridoce), para o qual as pessoas ainda olham com olhos de carinho e ternura. Esta é a minha salvação, saber que as pessoas ainda gostam de mim e, inclusive, me leem. Inclusive, se eu pessoalmente te falei deste blog é porque gosto muito de você e confio meus sentimentos e pensamentos a você. Não que seja uma honra, mas uma mostra de profundo respeito e consideração por sua pessoa, afinal, não me interessam os holofotes, elogios e etc em torno do que escrevo por aqui. Em tempos de extremismo, ter alguém com quem compartilhar nossos pensamentos, sem medo de tomar um tiro ou ter o coração pesado na balança de Anúbis, é uma honra.

Mas escrever tornou-se subversivo, coisa de ideologia marxista. Então tenho dedicado meus dias a trabalhos braçais, mesas redondas de futebol, pornografia e ao estudo adestrado para concursos. Daqui a pouco, vou capinar um quintal, pela honra do meu querido Brasil. Então não me julgue e não me espere para o próximo texto, porque pode demorar.

Brasil!

quinta-feira, 13 de dezembro de 2018

Amanda

Hoje é dia de texto "choro no banho". Uma "fraquejada", como andam dizendo por aí.

Há um ano e um mês eu escrevi um dos textos mais polêmicos deste blog, na impulsividade de um teclado de celular, deitado em um sofá de uma sala escura da casa de um amigo, numa madrugada de domingo para segunda.

Eu poderia apenas ter ido dormir na cama, mas não... Insisti em ficar escrevendo no breu, na telinha de um celular. Fiz merda. Fui babaca, em alguma medida. Chateei talvez a garota de quem eu mais gostei nos últimos anos.

Hoje penso que fui vaidoso de certo modo.

Se nada acontece, eu também tenho culpa. Muita culpa, talvez. Quem sou eu para me julgar uma "escolha excelente"? Quem sou para me julgar um não-babaca? Fui presunçoso. Quem sou eu para me julgar um cara legal?

Aquilo que considero virtudes pessoais podem ser grandes defeitos na visão alheia. E foda-se. Como disse um amigo meu um tempo atrás, somos babacas grande parte do tempo e estamos em constante luta para tentar não sermos. No fim, é meio isto. Sou mais um babaca, preconceituoso...

Não sou uma escolha melhor. Talvez só uma escolha como as demais. Demorei um pouco a entender isto, porque isto envolve autocrítica e parar de acreditar naquele papo de "você é tão legal, tudo que eu sempre busquei, mas não vai rolar". Tenho me incomodado cada vez menos com as recusas, me recuperado com uma estranha celeridade. Isto me faz sentir-me meio babaca e descrente, mas ao mesmo tempo me sinto mais forte. Menos humano, talvez.

Mais cabeça de gelo, mais "foda-se" e menos sentimento. Uma pena, em alguma medida. Nos últimos 3 anos saí de dentro de minha concha e me ofereci às pessoas, de peito aberto, com intensidade. Tudo está dando certo na vida, resolvi tentar tornar esse "tudo certo" em algo ainda mais completo, alcançar a fronteira final: minha vida afetiva. Fiz coisas que nunca antes tinha tido disposição em fazer. Me empenhei em tentar. Por 3 anos eu resolvi buscar a satisfação afetiva em detrimento das demais. Não busquei "o amor da minha vida". Busquei envolvimento afetivo, misturar as tintas. Falhei, como no aprendizado do inglês. Falhei. E na vida se falha.

Quando se falha, é preciso investigar os motivos. Quando eu penso que estou sendo legal, eu posso estar sendo chato. Quando penso que estou sendo flexível, eu posso estar limitando a liberdade alheia. Quando penso que estou tocando o coração das pessoas, eu posso estar sendo um "romântico" inoportuno. 

Preciso pensar. Entender. Aos 13 anos, pedi um beijo e ganhei um beijo dentro do ouvido. Me retirei de qualquer vida afetiva por 12 anos e só voltei aos 25 anos de idade. Nos últimos 3 anos eu realmente fiz da vida afetiva uma das minhas prioridades, após ignorá-la por anos focado em outros projetos. Eu quis desta vez ter uma vida assim. Quis e tentei. Mas não deu.

Falhei novamente. Tentei tocar o coração das pessoas. Toquei somente o coração que eu não poderia tocar. O resto foram recusas. Recusas justas, afinal. Agora entendo. Me vejo como um homem comum, repleto de defeitos como os demais. Nada de "escolha excelente".

Não dá para continuar falhando sem parar para refletir.

Talvez seja hora de se retirar novamente e deixar pra lá esse negócio de vida afetiva. Me repensar como pessoa. Só voltar quando for hora. Estudar, trabalhar... Levar uma vida como era antes de eu me oferecer às pessoas. Neste momento, sinto que talvez seja a hora de voltar para dentro da concha, do meu mundinho.

Não estamos neste mundo para ser a escolha "suficiente" ou "excelente" de alguém. Tudo que quero é ser um cara cada vez mais honesto e decente. Se eu for honesto e decente, vou sentir-me bem diante do mundo, sendo ou não a escolha de alguém.

Aquela garota, hoje namora. Mudou de planos sobre namorar, ao que parece. Ou talvez o problema estivesse só em mim mesmo. E se for isto, eu tô muito de boa com isto. Porque hoje consigo ver o quanto sou falho. Enfim! Invejo um pouco o cabra que conseguiu tocar o coração dela. Mas e daí? Quero que ela seja feliz. E eu preciso parar de invejar aquilo que não fui capaz de conquistar.

Vou sossegar, viado. Estudar e trabalhar. Tentar ser honesto e decente.

sábado, 1 de dezembro de 2018

Ana Marcela

É preciso buscar nas pessoas o que elas têm de melhor. Aliás, não é preciso necessariamente buscar, mas conseguir enxergar.

Não há inverno que dure para sempre e nem pessoas sem qualquer qualidade. Assim como as estações se alternam a cada 4 meses, as pessoas mudam, mas em uma frequência maior. Os quereres de agora não são mais os quereres de anos, meses, dias ou até mesmo de horas atrás. Somos "metamorfoses ambulantes". Estamos mudando a todo o tempo, ainda que com diferentes velocidades.

Por mais corrompidas e viciadas que as pessoas possam aparentar ser ao nosso subjetivo julgamento, todas elas trazem em si qualidades. Saber descobrir, conseguir enxergar e bem utilizar estas qualidades é um grande, porém, delicioso desafio.

Alguém já disse, em algum lugar, que um desafio é um problema que escolhemos ter, ao passo que um problema é um desafio que não escolhemos ter. Decifrar as pessoas deve ser visto como um desafio. Um desafio que se renova na metamorfose dos anos, meses, dias e horas.

Dispor-se as explorar as qualidades do outro é, em alguma medida, um exercício de humildade, de reconhecimento das potencialidades que o outro pode ter.

Em um mundo onde tudo é cada vez mais relativo (para o bem e para o mal), às vezes é preciso relativizar aquilo que vemos como defeito para, só assim, conseguir enxergar qualidades no outro. O preconceito cega e impede que consigamos enxergar o que as pessoas podem ter de bom.

Óbvio que todos nós temos nossa própria régua daquilo que julgamos ser um defeito ou uma qualidade e do quanto algumas características alheias podem nos parecer inaceitáveis/insustentáveis. Mas por mais paradoxal que isto possa parecer, é preciso enxergar além do "dark side of the moon" das pessoas. 

Em uma sociedade cada vez mais individualista e vaidosa, tendemos a buscar primeiro os defeitos alheios do que suas qualidades. Talvez inclinados pelo senso contemporâneo de que o inferno são os outros. Em verdade, somos todos céu e inferno, sol e tempestade. Fechamos os olhos ao que as pessoas têm de brilho e buscamos avidamente pelo o que elas têm de trevas e de menos notável. Talvez por um senso de sobrevivência, de busca por proteger-se do outro, ou então, também pode ser um reflexo de nossa necessidade de, ainda que implicitamente, buscarmos nos afirmarmos como superiores em uma sociedade onde tudo é cada vez mais concorrido e sujeito a likes e dislikes.

Costumo dizer que a história é escrita pelos "vilões" e pelos "malvados" e que os homens "bons" não marcam a história. O que as pessoas apresentam e fazem de ruim parece ter um impacto muito maior sobre nós do que aquilo que elas fazem e são de melhor. As lembranças e a história, assim como o noticiário, tendem a buscar as coisas ruins em detrimento das coisas boas; assim, ficamos sempre com a sensação de que as pessoas e o mundo são mais ruins do que bons. 

Ora, a mesma humanidade que produziu armas de destruição em massa foi a humanidade que encontrou diversas curas para salvar mais vidas do que as armas são capazes de ceifar diariamente. A mesma humanidade produziu Jesus Cristo e Adolf Hitler. Cabe a nós escolher qual lado estaremos mais dispostos a enxergar.

Uma vez, em um rápido papo de viagem de ônibus, perguntei a um colega de trabalho como ele percebeu e decidiu, de certa forma, que a esposa dele era a mulher com quem ele queria construir uma vida a dois e ter filhos. Em resposta, ele me disse, em suma, que todas as pessoas têm muitas qualidades e defeitos e que a esposa dele foi a pessoa com quem ele se relacionou cujos defeitos menos lhe incomodaram e mais eram toleráveis. 

Ou seja, ele escolheu sua esposa, em alguma medida, sopesando o quanto os defeitos dela eram menores do que os de outras pessoas, segundo o padrão estabelecido pela régua pessoal dele. Achei este ponto de vista intrigante. Óbvio que ele avaliou as qualidades dela, mas os defeitos tiveram um papel primordial no processo de escolha. 

Para entender este raciocínio, cheguei à conclusão de que, no fim das contas, ele relativizou os defeitos dela a ponto de eles tornarem-se pouco relevantes e as qualidades se sobressaírem. E aí tudo fez sentido para mim e corroborou minha ideia de que para ver as qualidades não precisamos ignorar os defeitos, mas não deixar que eles ofusquem o que as pessoas podem guardar de melhor.

É preciso escolher um referencial: enxergar com mais interesse o que as pessoas apresentam de melhor ou aquilo que elas apresentam de pior.

O relevante é o ponto de encontro entre tudo aquilo que somos e aquilo que efetivamente interessa às pessoas. Então, se aquilo que interessa ao outro é o que temos de defeitos, o que nos tornará relevante ao outro será aquilo que somos de ruim, e não todo o resto que temos de bom. Daí a importância de percebermos, o quanto antes, qual referencial temos buscado nas pessoas, para que saibamos o que tornamos relevante nas relações humanas e possamos mudar o referencial adotado.

No fim, somos todos imperfeitos e falhos. Somente quando nos damos conta disto é que passamos a dar valor e a respeitar as virtudes alheias.

O mundo é bão e as pessoas também.

sábado, 24 de novembro de 2018

Maria Sofia

Amanhã, na alvorada do dia, vou para meu julgamento racial. Quis o destino que o tribunal fosse no mesmo lugar onde tudo se tornou possível, atrás dos muros do local que mudou minha vida, para sempre.

Mas não é de cor, de raça (no sentido de força criativa) ou de "choro no banho" que venho falar desta vez. 

Venho falar de humildade.

Meu julgamento racial me fez pensar no quanto hoje somos tão bélicos, tão conflitantes e pouco dispostos a aceitar decisões e escolhas sem recorrer. Além do senso crescente de irresponsabilidade que torna ninguém responsável por nada, vivemos uma época em que ninguém aceita nada. E isto, muitas vezes, é fruto de um orgulho fudido que cega as pessoas e faz com que elas não tenham humildade de reconhecer que podem não estar certas.

Isto se reflete em todas as áreas.

Na Era da Informação, todo mundo se sente meio dono da razão e do conhecimento, capaz de, muitas vezes sem embasamento algum, não aceitar as decisões/opiniões daqueles que têm muito mais conhecimento sobre algo do que nós mesmos. Recorre-se até sem saber do quê, muitas vezes.

Não se respeita o conhecimento alheio. Não se aceita a opinião alheia.

Isto, a meu ver, é uma puta falta de humildade. Ser humilde não é tudo aceitar sem questionar, mas reconhecer que não temos todo o conhecimento, que estamos errados e os outros estão certos em diversas ocasiões. Óbvio que temos nossos portos seguros, aqueles assuntos dos quais somos profundo conhecedores. Porém, mesmo esses assuntos, não sabemos tudo. Precisamos estar abertos a ouvir e, principalmente, a aprender.

Quando uma pessoa perde a capacidade de ser humilde, ela perde a capacidade de aprender. E quando se perde a capacidade de aprender, se perde a capacidade de evoluir como ser humano e tornar-se melhor. Não sei se a origem da palavra "humildade" é a mesma da palavra "humano", mas penso que muito perdemos de nossa humanidade quando nos deixamos levar por um orgulho cego, por uma vaidade inconsequente e por um enganoso senso de superioridade. Ninguém perde tanto com o orgulho desmedido como nós mesmos. Ser orgulhoso nos torna fechados ao outro, nos fecha ao conhecimento que não temos, nos fecha ao mundo.

Não digo só sobre respeitar o conhecimento alheio. Digo também sobre respeitar a autonomia do outro em sua vida. Quem somos nós para avaliar o acerto ou o desacerto das decisões que as pessoas fazem em suas vidas? Claro que muitas vezes já passamos pela mesma situação e nos sentimos mais experientes e sabedores do que o outro sobre uma decisão de vida, mas as vidas são tão singulares , diferentes umas das outras, que qualquer avaliação sobre o que o outro escolheu fazer de sua vida deve trazer em si a humildade do reconhecimento de que podemos estar errados.

Uma vez, em um debate virtual com um ex-colega de escola, ele escreveu para mim, com o horrendo capslock: "ERRADO! 100% ERRADO!". Deus! Como alguém pode realmente pensar algo assim sobre qualquer coisa acima da terra e abaixo do céu? Como alguém pode ter tanta convicção sobre alguma coisa? Nem sobre nós mesmos somos capazes de ter convicções 100% certas. Quanto mais sobre temas que envolvem divergência de conhecimento.

O mundo precisa de mais humildade. Isto é uma forma de respeito ao outro. Se tudo se sabe, nada faz muito sentido em nossa existência terrena. Deve ser difícil ser Deus. O não saber move, motiva, incentiva. O mundo precisa disto. A humanidade precisa disto.

Uma vez, ao perguntar a profissão de uma pessoa para quem eu prestava meu serviço jurídico, esta pessoa me respondeu um nome de profissão bem estranho, que nem lembro ao certo. Algo do tipo "auxiliar de frios". WTF? Óbvio que perguntei a ele o que um "auxiliar de frios" fazia. Ele ficou emotivo com minha curiosidade, com meu interesse em entender uma profissão tão simples, que consiste em organizar produtos gelados nas prateleiras de supermercados. Tentei explicar para ele que todo conhecimento é válido e que o que ele sabe fazer, eu, com meus 5 anos de universidade, não tenho a menor ideia de como fazer. Tentei explicar para ele que não há hierarquia no saber e que é preciso haver respeito entre os diferentes conhecimentos. Há cerca de um mês eu sequer sabia calibrar um pneu de carro, um conhecimento simples para alguns, mas que eu dependi de um amigo para me acompanhar, me ensinar e eu aprender.

Saberes diferentes não se hierarquizam, mas se complementam e se trocam.

A vida é uma constante troca, inclusive de conhecimento. E isto torna a vida solitária algo incompatível com a essência do que é ser humano.

É preciso humildade para entender que não sabemos tudo, que há coisas que não somos capazes de resolver ou entender sozinhos e que as escolhas/decisões do outro não são passíveis de serem julgadas com certeza de acerto por nossas convicções pessoais.

A vida flui com mais tranquilidade quando se aprende a aceitar que o outro pode deter conhecimentos que não temos. A vida flui com mais tranquilidade quando se aprende que o outro pode ser aquilo que não somos.

Amanhã, aceitarei qualquer julgamento racial, sem recorrer.