sábado, 10 de março de 2012

[FILÉ COM FRITAS] Brasil: o país do amanhã.

[FILÉ]

Definitivamente, o Brasil é o país do amanhã. O país do amanhã eu faço.

Cada dia mais me surpreendo com a capacidade do povo brasileiro de deixar tudo sempre para a última hora. Não sei se é algo cultural, genético ou sei lá o quê. Mas não é segredo para ninguém que, em regra, gostamos sempre de enrolar para resolver as coisas.

Somos a 6ª economia do mundo e em breve seremos a 5ª, dizem os especialistas. Em tese, seremos um dos grandes países do amanhã, juntamente com outros países emergentes, dizem os economistas. Contudo, me espanta como os economistas são tão confiantes em relação a isso. São todos cegos! Veem apenas o lado econômico da coisa, acreditam que uma economia forte faz um país ser grande. Partem de um pressuposto errado? Não. Só esquecem que esse pressuposto é válido apenas para países desenvolvidos, países que alcançaram elevados níveis de desenvolvimento social após aquelas décadas do chamado Estado do Bem-Estar Social; esquecem que abaixo da linha do pecado, digo, do Equador, o nível de desenvolvimento econômico não acompanha o desenvolvimento da educação, dos serviços públicos...

Para mim, no Brasil não tivemos a época do chamado Estado do Bem-Estar Social. Vivemos há décadas um sistema híbrido que alia liberalismo econômico com paternalismo social. E pagamos caro por isso. Queremos evoluir no campo social, mas os liberais ficam dizendo que isso é ideia retrógrada, que a época disso já passou, que o negócio é ser neoliberal, como os países desenvolvidos, aí ficamos no meio do caminho: entramos de cabeça no sistema neoliberal fingindo que já tivemos (como os países desenvolvidos efetivamente tiveram) um período de Estado Social. Resultado: temos crescimento econômico e queremos manter os avanços sociais que pensamos termos feito nas décadas passadas. Vai dizer que nunca ouviu algum especialista dizer que o SUS é o melhor sistema PÚBLICO de saúde do mundo e que precisamos mantê-lo cada vez melhor? Para mascarar os avanços sociais que não tivemos ficamos inventando bolsas migalhas por aí, auxílios assistencialistas que achamos que podem resolver de imediato as falhas crônicas do nosso sistema social. Queremos sempre mascarar o agora para resolver, se der, depois.

Essa parece ser a tônica da nossa política. Vivemos de promessas. Por quê? Porque acreditamos em promessas. Acreditamos sempre que alguém fará amanhã; e digo mais, nos contentamos em ter a esperança do amanhã. Acontece, entretanto, que desde os anos 70 somos o tal país do amanhã. De um amanhã que nunca chega e, para mim, enquanto continuarmos nesse espírito de resolver no futuro, nunca chegará. Voltando às promessas, destaco que também acreditamos nelas porque levamos nossas próprias vidas “na promessa”. Repito: não sei se é cultural, mas a verdade (pelo menos a minha) é que gostamos de deixar tudo para depois e só quando o depois está prestes a estourar na nossa fuça é que tomamos uma atitude enérgica. Até lá gostamos de “cozinhar o galo”. Para alguns, isso é preguiça, razão pela qual dizem que somos um povo preguiçoso, conclusão que cada vez mais luto para não ter.

Numa democracia representativa como a nossa, os governantes não são nada mais do que um espelho de quem os elege. Partindo dessa premissa como verdade, tenho que se o Poder Público sempre que pode retarda ações efetivas para resolver os problemas nacionais, é porque isso é reflexo do que os brasileiros costumam fazer para resolver seus próprios problemas. Talvez isso explique, em parte, a nossa paixão pelos “jeitinhos”, afinal, eles não são nada mais do que meras soluções improvisadas para problemas imediatos. Problemas que muitas vezes poderiam ter sido evitados se no passado tivéssemos agido de modo mais enérgico quando o problema ainda era pequeno. Costumamos esperar um vazamento virar um desmoronamento para agirmos de alguma forma efetiva. É comum, por exemplo, situações em que o Poder Público faz uma obra, deixa de herança um buraco mal tampado e só volta para fechá-lo efetivamente quando alguém cai nele e morre. Só agimos com pressão. Só rompemos a inércia quando se omitir já não dá mais; já não é mais opção. Por que esperar diversas pessoas serem atropeladas numa rodovia antes de se construir uma passarela? Por que esperar o corrupto roubar de novo para reclamar dele depois? Não o eleja então, cacete! Por que esperamos as coisas acontecerem do pior modo possível ou ficarem prestes a chegar nesse nível para agirmos?

E a burocracia? Quantas vezes você já teve a sensação de que ela existe só para você desistir de fazer algo? Parte do objetivo dela é este mesmo: desestimular cobranças por ações imediatas; dar tempo para o Poder Público enrolar para resolver o problema. O negócio é enrolar. Enrolar ou deixar para outra pessoa resolver amanhã; transferir o agir para depois e, de preferência, para outra pessoa.

Tenho me divertido muito com as obras da Copa do Mundo. Tudo muito lento e parecendo que não vai ficar pronto a tempo. O mundo civilizado está morrendo de medo de nós (da selva) não termos obras prontas para o mundial. Eles não nos conhecem... Eles não sabem que tudo aqui tem que “ter emoção”, ser feito com jeitinho e sufoco. Não teria graça ter feito tudo com 1 ano e meio de antecedência. Não seria uma copa brasileira; seria uma copa alemã ou japonesa no Brasil. Relaxem, gringos! Vai ficar tudo pronto (ainda que o cimento da arquibancada fique seco no dia do 1º jogo). Relaxem. Vocês vão poder se divertir na 6ª (ou até 5ª) economia do mundo. Semana passada o secretário-geral da Fifa, Jérôme Valcke, disse que precisávamos de um chute na bunda para acelerar as obras. Nossa! “Ui! Como somos delicados...” Para o governo brasileiro isso foi quase uma declaração de guerra. Pergunto: Que mentira o homem branco do norte disse? Ele disse apenas que somos muito tranquilos para fazer as coisas urgentes. Que estamos retardando mais do que deveríamos obras que já deveriam estar prontas (tanto estádios como infra-estrutura: estradas, aeroportos...). Nós somos muito engraçados mesmo: adoramos sermos bajulados; queremos ter razão, mesmo estando com a tarefa de casa atrasada. E ainda queremos justificar o porquê! Foi um puxão de orelha merecido! E digo mais, deveríamos ter vergonha por estarmos assumindo frente ao mundo todo que só estamos tentando resolver problemas de infra-estrutura porque temos que parecer bem organizados ao mundo durante a Copa e as Olimpíadas. Noutros termos, só estamos saindo da inércia para não passar vergonha, para aparentar sermos um país organizado. Não estaríamos movendo uma palha do lugar para melhorar os aeroportos e as estradas se não tivéssemos que receber o mundo em 2014 e 2016.

Somos assim. Desde muito tempo. Pensamos que tudo pode se ajeitar depois; quem sabe amanhã. Mas eu ainda acredito que o nosso amanhã vai chegar, afinal, como consta no título de um dos filmes de 007: O amanhã nunca morre.

A você que não sei (e "nunca" soube) se sente o mesmo que eu.