quinta-feira, 28 de março de 2013

Balanço

De coração aberto para falar sobre assuntos que raramente gosto de conversar.

Tenho uma relação peculiar com o tempo. Pelo menos penso que tenho. Eu ajo como quem não se importa com ele e ele passa como quem não se importa comigo. E isso causa estranheza em algumas pessoas.

Não vivo como quem acha que pode morrer a qualquer momento - embora eu mesmo já tenha feito um texto neste blog defendendo que esse era o melhor jeito de levar a vida. Ajo como quem tem a certeza de que vai viver até os 100 anos; como quem não tem pressa em fazer o que pode ser feito a longo prazo. Ajo como quem consegue ter controle sobre o tempo e não sente ele passando. Isso tem muitas consequências, sobretudo, na minha falta de pressa em tomar decisões definitivas sobre diversos temas. Alguns dizem que é mera indecisão; eu prefiro dizer que é apenas falta de pressa.

Assim tenho vivido por 23 anos: resolvendo e buscando conquistar imediatamente aquilo de que minha própria subsistência e de minha família monoparental depende "pra ontem" e deixando todo o resto ser conduzido pelo tempo, como ele entender conveniente, até o momento exato de eu decidir em definitivo o que fazer.

Vivo como quem julga ter todo o tempo do mundo pra tudo - ou melhor, quase tudo. No próximo mês pego meu canudo na universidade e daqui há uns 2 meses pego minha carteira da OAB e fecho um ciclo de escolha profissional - isso na cabeça dos comuns. Na minha cabeça, ter uma carteira pra advogar e um diploma de nível superior não fecha qualquer possibilidade. Ainda acho que posso ser astronauta se me dedicar e tiver condições físicas para tal; ainda acho que posso ser campeão mundial de fórmula 1 se começar o quanto antes a andar de kart; e também acho que posso ser campeão olímpico de atletismo se eu começar a treinar. Ainda penso que dá pra ser professor, ator e até padre. "Este cara deve ser louco" - você deve estar pensando. Não sei se sou, mas essa "loucura" toda decorre da minha sensação de que ainda tenho tempo pra fazer quase tudo. Até que me provem de maneira inequívoca que não é possível fazer algo, eu não desacredito. É sério. Eu deixo como um projeto guardado, mas nunca como um projeto arquivado em definitivo.

Apesar desse aparente estado de indecisão, estou certo de que, por ora, vou fazer aquilo que me parece que dá pra fazer e que precisa ser feito por uma questão de subsistência. Não sou de mudar tudo 180º do nada. Achar que ainda tenho tempo pra tudo me faz não ter nunca a sensação de frustração por não ter conseguido concluir algo. A minha regra é não querer planejar tudo. É ter um ponto de partida e deixar o tempo ir ajeitando o resto pro momento oportuno eu ver se dá pra fazer ou não. Construo um caminho sólido sem ignorar que posso ainda construir outros.

Tudo que tenho são 23 anos. Me causa repulsa crer que por estar apto a exercer carreiras jurídicas a minha vida está resolvida. Tenho só 23 anos. O futuro me parece convidativo; não me causa um medo paralisante. Ele me causa curiosidade, vontade de ir e ver o que dá pra fazer. Sem planos de aos 50 anos ser juiz federal. Tenho planos para no máximo daqui a 2 meses, embora eu tenha metas secundárias de longo prazo (ter uma casa, um emprego prazeroso, filhos...). Penso que é preciso ter algumas metas de longo prazo, mas sem qualquer obsessão de cumprí-las. Neste mês conquistei muitas coisas no âmbito profissional e muita gente apareceu para me parabenizar e apontar o que fazer. Como pode quem nunca fez a minha barba querer me dizer com autoridade o que vou ser? Quantas vezes ouvi apontarem meu futuro? Quantas vezes ouvi me dizerem pra onde seguir a partir de agora? Quantas vezes ouvi que agora estou resolvido na vida? Muitas vezes em apenas 1 mês. Ainda bem que sou humilde e atencioso pra educadamente escutar, mas rebelde em obedecer. O meu futuro não é meu e tampouco de qualquer um que dê orientações sobre ele, ainda que de boa vontade. Posso planejá-lo, me preparar pra ele; mas não sei o que ele me reserva. É óbvio que sei que tenho participação na construção desse futuro, mas também sei que não tenho sequer 50% do controle sobre ele. É extremamente provável que eu não vá ganhar 5 mil reais no meu primeiro mês de advogado, como muitos planejam que eu vá ganhar, porém nada aponta em definitivo que eu não posso conseguir isso. Entende? Eu terminei uma fase e não tem nada pronto. Meu pacto com o tempo é assim. Eu deixo ele trabalhar em paz e ele me deixa ir ganhando dias, meses e anos com a sensação de que vou chegar aos 100 anos.

Fracassos? Tenho alguns com 23 anos. Dois me incomodam um pouco mais. Falhei miseravelmente em aprender línguas e na vida afetiva. Lidei com ambos temas naquele esquema de que tenho tempo pra tudo que não diga respeito à subsistência de minha família monoparental. Resultado: perdi uma boa chance que tive de não falar inglês como um aborígene da Austrália e até hoje não agi de modo conclusivo com nenhuma garota. Saliento, no entanto, que ambos fracassos ainda podem ser corrigidos! Quanto às garotas, o meu problema é que lido com elas com a sensação de que tenho todo o tempo do mundo para conquistá-las; sem desespero. Reflexo claro disso é que alguns amigos dizem que eu ainda tento algo com uma garota que conheci na época dos meus estudos para o vestibular em 2007 e que, apesar desse longo tempo, ainda não me resolvi em relação a ela. Em minha defesa tenho a alegar que tirando uma vez que a convidei para ir ao teatro e ela recusou - por um motivo que não sei ao certo se tinha a ver com um desinteresse por mim -, eu pareço nunca ter dado motivos para ela achar que eu estava efetivamente querendo algo com ela. Falha minha? Sim. 6 anos é tempo suficiente para eu já ter resolvido isso. Acho que nunca aprofundei nossos contatos a ponto de chegar numa situação de ela dizer "só te quero como amigo" ou "vamos nos conhecer como mais que amigos" e tenho uma explicação para essa lerdeza. Depois de 6 anos eu continuo achando que não tenho muito a oferecer a ela (ou a qualquer garota) além de um cara de bom coração e disposto a viver com cumplicidade o que tiver que ser vivido. Sei lá. Sinto que me faltam coisas que outros caras parecem poder dar (nem dançar eu sei - rsrs) e um pouco de referência para saber o que fazer no caso de conseguir convencê-la a me dar uma chance. Além disso, nunca soube se atendo ao nível que ela espera em um rapaz e nunca senti muita reciprocidade por parte dela no que tange a sentir algo maior do que amizade por mim. Enfim, hoje não estou tentando nada de concreto com ela, embora ainda não a tenha descartado, como quase tudo na vida. Apesar disso, meus amigos erroneamente entendem isso como um "não desistiu dela e não tem olhos para mais ninguém". Desistir, de fato eu não desisti, mas porque não desisto de quase nada na vida, e não porque eu só queira ela.

Apesar desses insucessos, eu vejo como virtude levar a vida sem excluir em definitivo algum caminho. Tento sempre entrar em uma porta específica e deixar todas as outras entreabertas. Ou seja, eu me decido, mas nunca à caneta. Escrevo minha vida a lápis e só passo caneta naquilo que julgo não ter risco de ser desfeito. Veja bem. Eu tomo decisões; caso contrário eu não teria chegado a lugar nenhum aos 23 anos e estaria imerso quase que numa anarquia comportamental. Mas eu também não planejo nada para muito distante. Dizem que é coisa de gente que pensa pequeno. Não sei. Só sei que até hoje conquistei muitas coisas que não planejei com antecedência e que para muitos seriam consideradas conquistas grandes. Pra mim é tudo natural. No tempo certo eu alcanço o sucesso profissional. No tempo certo eu terei a oportunidade de casar e ter filhos. No tempo certo eu morrerei. Deixo o tempo fazer o papel dele e vou tentando influencia-lo, sem obriga-lo a me conceder nada.

Antes de concluir, resta responder a uma indagação sua, qual seja: "Quando perceber enfim que não há tempo para fazer tudo ou ser tudo que ainda pensa em ser na vida, como irá reagir? Irá se frustrar?" Respondo: Me frustrar jamais. Tento apenas estar pronto e tentar fazer as oportunidades surgirem. Se não der pra ser, por exemplo, um astronauta, irei me conformar, desde que eu tenha a certeza de que fiz tudo aquilo que me competia fazer no tempo em que precisei tomar decisões que abortaram o projeto. E se eu não tiver a certeza de que fiz tudo também não me frustrarei, pois sei que não se pode ser tudo ao mesmo tempo na vida, ainda que se queira. Vou te dizer uma coisa, pode parecer que não, mas quando preciso eu sei me decidir e passar a caneta. O problema é que tem muita gente que tem uma noção de tempo diferente da minha e por isso me rotula de indeciso. Paciência.

Nesta semana, vi um jornalista dizendo que Neymar tem apenas 21 anos e não pode carregar o peso de ter que vencer uma copa do mundo com essa idade, principalmente por ser a primeira dele. E eu? Aos 23 anos preciso ser obrigado a fazer escolhas vencedoras na vida? É evidente que tenho que fazer escolhas, mas e se eu errar? Acabou? Estarei condenado ao fracasso do mau caminho que escolhi? Claro que não. O Neymar poderá jogar e vencer muitas copas na vida, ainda que perca a de 2014, e eu ainda terei muitos anos para viver, fazer escolhas que estarão certas e corrigir escolhas erradas do passado.

23 anos. É tudo que tenho - e muito pouco perto do que ainda posso ter.

Esse é o meu balanço.