terça-feira, 30 de outubro de 2018

A falar

Céus! Eu não consigo parar de escrever. Geralmente, isto não é bom, mas, sei lá, hoje me sinto meio só e, quando assim estou, preciso escrever para me encontrar.

Hoje será texto autobiográfico, desculpe. Preciso falar.

Às vezes me espanto como meu sentido visual é mais aguçado do que os demais. Me interessa tudo que esteja ao alcance dos meus olhos, desde as meias dos transeuntes até as pichações urbanas. Tenho olhos de esponja. Tudo observo, tudo interessa aos meus olhos. Eu preciso do que vejo como preciso do ar que respiro. Não sei o que seria da vida sem meus olhos. Obrigado, Deus!

Mas quem tem olhos, sofre. Eu ainda mais. Meus olhos me abrem janelas. Aquilo que vejo mistura-se com minha imaginação em doses preocupantes. Não alucinações, mas os pensamentos que se abrem a partir do que vejo.

Eu sofro pelos olhos. Por isso, muitas vezes, prefiro não ver. Certa vez, por exemplo, vivi uma dor afetiva tão intensa que, para estancá-la, eu sequer procurava por meus contatos do Whatsapp que estavam abaixo da letra inicial do nome da pessoa que me fazia sofrer. Dessa forma, eu evitava deslizar meus dedos e meus olhos pela foto de perfil da pessoa que eu tanto gostava. Parava nos contatos antes da letra do nome dela. Apesar do quanto isto pareça louco, isto me fez um bem danado, porque não vê-la sequer por foto afastava meus pensamentos dela. Vê-la por foto abria por meio de meus olhos um vendaval de pensamentos, lembranças e sentimentos. Não vê-la, ao contrário, era como manter trancados meus sentimentos. Aquilo que aprisionamos e esquecemos por muito tempo tende a definhar, "apodrecer", até morrer (como acontece algumas vezes com as pessoas que ficam presas e esquecidas nas prisões).

Aquilo que não vejo tem mais dificuldade de penetrar em meus pensamentos e de me entristecer. Uma solução covarde, talvez, daquelas de quem não quer enfrentar o problema. Mas, depois que perco o contato visual por muito tempo, sinto-me forte e capaz de não mais me afetar. Sinto-me pronto para encarar. E encaro. Só preciso de um tempo sem ver. É um raciocínio meio de "corno", porém, no meu caso, resolve.

Aquilo que vejo me aflige muito mais do que aquilo que ouço. Quando em realidade deveria ser aquilo que falamos o que mais deveria nos imputar senso de responsabilidade e pertença, afinal, da boca sai aquilo do qual nosso coração está cheio.

Hoje me sinto meio frustrado. Não pelo que vi ou deixei de ver. Só me sinto frustrado. E o que é a frustração senão um sentimento de incompletude? Um sentimento de impotência e de descrença que se sente quando algo não ocorre conforme o planejado. Às vezes é um sentimento injusto, que nada tem a lhe justificar, além de um desajuste de sentimentos. Mas é péssimo. A frustração é meio paralisante, sobretudo quando não sabemos o que foi feito de errado. E nem sempre algo foi feito de errado. A frustração muito mais tem a ver com nós mesmos do que com algo que ocorreu. 

Hoje o problema sou eu. Só preciso de um copo de leite com chocolate para eu me sentir abraçado ou de umas cervejas para eu ficar bem idiotamente risonho. Como amanhã é dia de acordar cedo, então hoje é dia de abraço de chocolate. E de texto. 

Amanhã, tudo estará bem.

domingo, 28 de outubro de 2018

Canto de vitória

Em noite de derrota
Não se sonha,
Perde-se a rota.
Sente-se vergonha.

Muitas perguntas,
Respostas de culpa,
Dúvidas juntas,
Nenhuma desculpa.

Choque de datas,
Uma só ida.
Escolha chata...
Puxa vida!

Houve preparação,
Não faltou raça
E nem coração.
Parece desgraça.

Uma falha estranha
A reprovação custa.
Falta de manha
E desatenção injusta.

Mas você é foda!
Não se entrega.
Pula a corda
E não arrega.

Em alma de liberdade,
Recurso é escravidão.
Mas mostra a verdade
E evita aberração.

Falta tempo,
Caracteres no fim.
Contratempo?
Vai dar sim!

Alegra-me sua história
Nesta noite de morte.
Cantar sua vitória
É a minha sorte.

Conquista com luta
E com raça?
Adoro uma disputa.
Você é uma graça.

domingo, 21 de outubro de 2018

Entre quadris e a cabeça

Caraca! Tô com o dedo nervoso esta semana. Escrevendo pra carai. Acho que a última vez que foram tantas seguidas foi na semana do 2 de julho, há uns 8 anos, quando eu gostava muito da "garota de nariz torto" e quis homenageá-la na semana do aniversário dela. Faz tempo... Tantas mudanças... Mas vamos ao que interessa. Estou falante!

Eu tenho problema com sonhos. Não aqueles que temos enquanto dormimos, mas aqueles que temos com os olhos abertos.

Sinto que os sonhos aprisionam, como uma conta a vencer no dia 20 ou 30 da vida. Eles podem pesar como carregar uma mochila.

Eu não sei. Talvez eu seja um pessimista, um desconfiado com a vida. Sempre penso que posso morrer antes do amanhecer. Não temo a morte, mas "perder" tempo aprisionado a um sonho.

Sonhos servem de bússola; apontam um norte e uma direção a seguir. Mas, como eu disse no texto anterior, às vezes, é quando erramos a rota e nos perdemos é que nos encontramos. Se um sonho aponta para o norte e nós seguimos à leste, teoricamente nos desviamos do rumo, porém, nem sempre isto é ruim.

Sempre fui muito "pés no chão" (talvez porque, durante muito tempo, a vida não me deu muitas opções) e isto, de algum modo, sempre me fez não ter muita coragem de sonhar coisas grandes. Durante minha graduação inteira, por exemplo, fui questionado se eu aspirava tornar-me um juiz ou promotor de justiça, e sempre respondi, com um ar meio sem graça, que eu aspirava tornar-me profissionalmente "aquilo que desse para ser". Às vezes, eu respondia com outra pergunta: "Ser juiz de vôlei ou de futebol?" Só para desviar o foco e causar risadas mesmo.

Em geral, as pessoas não entendem. Acham que jovens necessariamente têm que sonhar, aspirar alguma coisa que não seja droga pelas narinas ou fumaça pela boca. Eu entendo. De verdade, eu entendo. Sonhos podem nos colocar "na linha", nos dar um rumo quando não sabemos para onde ir. Mas eu realmente não consigo. Algumas vezes, não sonhar soa como falta de perspectiva, falta de ambição, desinteresse ou comodismo. E talvez seja isto tudo mesmo. Só que eu me sinto bem. Algumas vezes penso que se há 10 anos meu sonho fosse passar em um concurso público, eu já teria realizado meu sonho de vida profissional, e aí? O que me motivaria a continuar? Percebe? Dilma estava certa; precisamos não traçar meta e deixar a meta aberta. Você vai sentir quando tiver batido sua meta e aí, por não ter ter alçado à meta a sonho de vida, você poderá dobrar a meta e seguir adiante realizando pequenas coisas grandes na vida, sem perceber.

A vida pode ser curta demais para que vivamos escravizados por um objetivo de vida. E se o sonho de vida não se concretizar? Como lidar com isto de modo saudável, sem adoecer, perder o encanto com a vida e se frustrar? Eu tenho medo deste tipo de decepção. Porque tem coisas que, por mais que a gente se esforce, por mais tempo que a gente se dedique, não acontece e, ao fim, fica aquele gosto estranho na boca, aquela sensação de perda de tempo, de "treinei muito para ser roubado". É difícil lidar com as derrotas que não entendemos o porquê. Talvez eu seja um frouxo, me esconda atrás da falta de sonhos para não ter motivos para me decepcionar. Isto, só o tempo me dirá.

Num exercício de autocrítica, enxergo que algumas coisas podem ser sonhos em minha vida, mas são coisas tão bobas, que não sei se merecem o status de "sonho". Eu sonho em ter uma vida que me permita ser feliz, não passar necessidade e que me dê alguma condição de poder ser atuante e fazer a diferença na vida de alguém. Não sonho com férias em Dubai ao lado de um harém. Me bastaria um amor tranquilo, filhos catarrentos, felizes e educados para eu deixar de herança para o mundo, uma casa agradável, saúde e condição financeira que me permita viver com algum conforto (nada de Ferrari na garagem) e dedicar mais do meu tempo em ajudar as pessoas. Isto é sonho? Me parecem coisas tão bobas e pequenas. São objetivos que talvez não valham o status de "sonho", porque parecem coisas que podem ser conquistadas naturalmente ao longo da vida, sem pressa, fanatismo e escravidão.

A palavra "sonho", para mim, remete a um desejo compulsivo, escravizante, capaz de amoldar todas as escolhas da vida para ser alcançado. Por exemplo, uma mulher que sonha ser uma empresária de sucesso pode, em nome deste sonho: abdicar de seus anos de juventude e não viajar e se divertir com seus amigos; abdicar/retardar o projeto de ser mãe; abrir mão de conhecer afetivamente outras pessoas; investir todo seu dinheiro e raramente utiliza-lo para adquirir pequenos "mimos" para si mesma; e, ao fim, não alcançar seu sonho maior e ser tarde demais para tentar voltar atrás e desfazer algumas das escolhas que foram condicionadas pela busca por seu sonho de vida. 

Óbvio que a vida envolve escolhas, apostas, riscos, acertos e desacertos. Mas quando se tem um sonho maior a nortear uma vida, tudo passa a orbitar em torno desse sonho, em órbitas escravizantes que limitam a liberdade de escolha. Alguns defensores dos sonhos dizem que conquistar um sonho de vida traz liberdade. Mas é preciso ser escravo para que se possa ser livre? E o risco de ao fim de uma vida escravizada por um sonho, por um único caminho ao norte, a liberdade "não cantar"? 

Talvez eu seja frouxo demais para sonhar e me decepcionar, ou tenha os pés no chão demais para conseguir fantasiar.

quarta-feira, 17 de outubro de 2018

Uma dose de coragem

A coragem é uma virtude, daquelas que vale uma vida. Aliás, só quem tem coragem é capaz de pagá-la com a vida.

Uma vida sem coragem é fadada à soledade.

Ser prudente é importante, mas não são de prudências que se escreve uma vida. A história é escrita pelos momentos de transgressão, de desafio e de experimentação. Se erra muito quando não se calcula as consequências, mas também se conquista quando se diminui a prudência. 

Alguns desacertos constroem mais do que acertos, pois marcam, ensinam e, algumas vezes, conquistam. Cabral pode ter se perdido em plena imensidão do Atlântico, não ter sabido para onde ir e chegado ao Brasil. Às vezes, somos assim na vida. Quando achamos que estamos mais perdidos é que nos encontramos e conquistamos nossos maiores tesouros.

Mas o que seria este texto? Uma ode aos erros? Não. Talvez uma ode à coragem.

E o que seria a coragem? Falta de medo de falhar? Penso que não. Coragem é não deixar de realizar, ainda que com medo. Aliás, quanto maior o medo, mais coragem se exige para concretizar. Coragem seria talvez a ousadia de realizar, ainda que sem saber ao certo o que resultará. É bravura de se lançar e arriscar. Todo ato de coragem envolve o risco de falhar. Se não envolve risco, não se requer coragem. Se não há medo, não é preciso coragem.

Somos humanos. Temos o direito de ter medo, inclusive o medo de falhar. Mas é preciso ter coragem para seguir, ter queixo de pedra, para apanhar e não se deixar abalar.

A coragem é um pouco isto, não se deixar vencer pelo medo da frustração. 

Porque, da falta de coragem, só nasce solidão.

Deus, nesta vida, só lhe peço uma dose de coragem.

sexta-feira, 12 de outubro de 2018

Windows

Ao entardecer, os olhos veem muitas coisas.

A intensidade dos raios de sol penetra no mais fundo de nossas retinas e, por vezes, tocam nossa alma. Sente-se a presença de Deus.

Um olhar que não encontra correspondência no fim do horizonte. Os pensamentos voam pelas janelas. Penso no dia de ontem, no dia de hoje e no dia de amanhã, enquanto o dourado do fim do dia invade o ambiente e meus olhos.

Penso em você ao avistar a cidade que se ergue imponente entre prédios, do outro lado do mar que nos separa. Tomado pela paz divina que invade meu ser, anseio por seus lábios. Outra vez.

Até onde meus olhos conseguem ver, vejo a silhueta de um imponente monte, contornada pela delicadeza dos dedos de Deus ao desenhar o entardecer. Penso em quanta coisa cabe na distância que nos separa do limite de até onde nossos olhos podem ver. Mata virgem. Muito a se desbravar. 

Há um mundo para além de nossos olhos, iluminado pela luz do entardecer. Basta olhar pela janela, algum dia, para perceber. É como se Deus nos desse uma oportunidade por dia.

Basta alongar os olhos e contemplar, como quem olha maravilhado de dentro de uma caravela, após dias de viagem entre as tormentas de um mar de problemas, decepções e descrença em relação ao mundo e às pessoas.

Há uma luz que emana do céu, todos os dias. Ela esteve lá todo o tempo, na verdade. É preciso se dar uma oportunidade de enxergar e vivenciar aquilo que está para além de nossos olhos. Encurtar as distâncias e acreditar que pode haver verdade em corações, afinal, nem todos são alguns. Há muita verdade naquilo que os olhos podem dizer e enxergar.

Ao fim, vem o luar, que hoje, como numa conspiração cósmica, a lua está a sorrir. Sim. Um sorriso naturalmente belo e meio desacostumado, como o seu.

Há agora um luar a iluminar aquilo que os olhos não mais conseguem ver, mas querem explorar.

Há muito a se descobrir.

Basta ir até as janelas.

segunda-feira, 1 de outubro de 2018

Notas de carnaval

Estes dias vi na TV um programa de talentos musicais nos quais os jurados só tinham como opções as notas 9.7, 9.8, 9.9 e 10.

Para mim, isto foi o reconhecimento de nossa incapacidade, como sociedade, de lidar construtivamente com a crítica.

Naturalizamos a mediocridade. Nos conformamos com coisas feitas com razoabilidade dando a elas status de coisas feitas com excelência. Talvez por isto ficamos meio surpresos quando encontramos um bom serviço, como se encontrar um profissional que realmente seja bom ou excelente fosse a exceção, ao invés de ser a regra.

Quantos encanadores, mecânicos, eletricistas, montadores de móvel, instaladores de internet, taxistas, professores, médicos etc medíocres encontramos por aí. Parece que eles se multiplicam. E são todos pagos. Gente que presta serviço sem preocupação com qualquer padrão de qualidade. Sabe quando você senta num táxi? Não parece muitas vezes que você está fazendo um favor para ele ao invés de estar pagando pelo serviço dele? É tosco, para não dizer indecente.

E a gente se acostuma com isto, com nossa realidade de serviços mal prestados. E no fim, com essa naturalização, nos tornamos complacentes com a mal feito, nos tornamos mais tolerantes e perdemos um pouco de nosso senso crítico.

Você já viu a apuração do desfile das escolas de samba? A regra são notas que variam de 9.5 a 10, sendo que 9.5 torna-se uma nota ruim e uma nota igual ou inferior a 9 só é dada numa situação absurdamente ruim, tipo um carro alegórico travado no meio da passarela ou um acidente durante o desfile. Que mundo é este onde 9.5 é nota baixa? Um mundo de bajulamento, de supervalorização, totalmente destoante do mundo crítico e até do mundo escolar, no qual tirar um 8.5 é uma puta nota e tirar 9.5 é um orgasmo.

Vivemos uma sociedade de baixo nível crítico, no qual ouvir uma verdadeira crítica é confundido com perseguição pessoal, com inveja, despeito, recalque etc.

Em uma sociedade acostumada com coisas mal feitas aceitas como suficiente, a crítica soa como um acinte, como falta de sexo. Somos uma sociedade de mimados e mal acostumados com aquilo que não é bem feito. Somos acostumados com a falta de beleza e de graciosidade que resolve razoavelmente.

Um programa de TV no qual a pior nota possível é um 9.7 é um bom exemplo disto, um bom exemplo de como somos injustos com aquilo que é verdadeiramente bom e o aproximamos tanto daquilo que está longe de ser bom. Separamos por 0.3 o sublime do medíocre. Desestimulamos o trabalho bem feito ao valorizarmos tanto aquilo que não é bem feito. Se ser meia boca basta, ir além do razoável se torna uma questão meramente de consciência, de vontade de fazer sempre o melhor, algo muitas vezes mal compreendido e menosprezado.

No fim, razão assiste a Santo Agostinho: "Prefiro os que me criticam, porque me corrigem, aos que me elogiam, porque me corrompem."